Com uma audiência pública do Fórum Suprapartidário por uma São Paulo Saudável e Sustentável, o prefeito Fernando Haddad deu início ao processo de debates com a comunidade sobre o Plano Diretor. Haddad não descarta os pontos bons do Plano Diretor antigo, mas afirma que é preciso construir um novo projeto ainda melhor. Para que os paulistanos entendam onde e como devem se encaixar nas discussões que começam agora, buscamos alguns representantes da socidade. Eles contam o que esperam para a cidade.
O que é o Plano Diretor?
O Plano Diretor é uma lei municipal que estabelece e organiza o desenvolvimento e expansão territorial de uma cidade. Em 2001, com o Estatuto das Cidades tornou-se obrigatório que municípios com mais de 20 mil habitantes tenham um Plano Diretor Estratégico elaborado pela prefeitura com a participação da sociedade civil. O Plano tem a função de garantir que as necessidades da cidade sejam atendidas e que haja melhora na qualidade de vida de seus moradores.
Em 2002, na gestão da prefeita Marta Suplicy, a cidade de São Paulo teve seu primeiro Plano Diretor Estratégico (PDE) colaborativo aprovado pela Câmara Municipal. Embora a vigência prevista fosse de dez anos, o Plano comandado pelo arquiteto Jorge Wilheim ainda não foi substituído. A revisão do PDE tornou-se então prioridade no programa de governo do atual prefeito Fernando Haddad.
Como pode ser a participação?
O diretor do Departamento de Urbanismo (Deurb), da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, Kazuo Nakano espera que as discussões do Plano Diretor Estratégico durem até parte do segundo semestre, para que então se iniciem os processos de revisão dos Planos Regionais Estratégicos, Lei de parcelamento e uso do solo e do Código de Obras. Nakano afirma que canais digitais serão utilizados para realizar debates e receber propostas, além da divulgação de eventos em meios de comunicação de massa.
O que pensa Nabil Bonduki, vereador (SP), relator do plano aprovado em 2002
O maior problema do plano atual foi a sua não implementação. Propostas boas como a geração de emprego na periferia, expansão de moradia no centro, criação de corredores de ônibus e o combate à especulação em terrenos ociosos não saíram do papel. Isso aconteceu principalmente pela troca de gestão. O governo Kassab não deu prioridade para o plano de 2002. Nesses casos, a população deve cobrar do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano, que é a instância responsável por garantir o cumprimento do que é determinado pelo plano diretor. Além do Conselho, o cidadão ainda pode realizar reivindicações junto ao seus representantes na Câmara de Vereadores.
A revisão é uma possibilidade de aperfeiçoar e atualizar o texto do plano de 2002. O ideal é ter o plano aprovado pela Câmara até o fim de 2013 para daí partir para outros processos como o zoneamento. A gestão do Haddad se mostra comprometida com a revisão e implementação do Plano Diretor, e a possibilidade de implementação da próxima versão é muito maior.
O que pensa Lucila Lacreta, diretora executiva do movimento Defenda São Paulo
A principal falha do plano anterior foi no controle de uso e ocupação do solo. Nele, a cidade é dividida em zonas residencias, comerciais, industriais e mistas. O zoneamento define as diretrizes do quanto e o que pode ser construído em uma determinada área. O grande defeito foi não levar em consideração os impactos das construções no sistema viário e na demanda de infraestrutura gerada especialmente pela superverticalização. Um exemplo é o bairro do Itaim Bibi que, como está, já evidencia sinais de esgotamento de infraestrutura e engarrafamentos frequentes, e que ainda assim continua em processo de expansão e verticalização. Por isso a revisão do Plano deve combater a super verticalização. Nossa maior reivindicação é a criação dos Planos de Bairros para que se tenha controle lote a lote e não só pelo zoneamento. O Arco do Futuro vai criar uma super oferta de solo a ser verticalizado e a difusão desta oferta atrapalhará a implantação dessas moradias.
Nos últimos dez anos, a qualidade de vida na cidade piorou muito e a questão da criação de uma cidade sustentável não foi pensada. A gestão atual deve ser ousada para enfrentar os interesses econômicos de setores como o mercado imobiliário que trata a cidade como uma mercadoria, ignorando a qualidade de vida dos seus ocupantes. Como sociedade, temos o papel de nos impor para pautar o governo na direção do bem geralO que pensa Lucila Lacreta, diretora executiva do movimento Defenda São Paulo
O que pensa Claudio Bernardes, presidente do SECOVI (Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo)
O modelo de desenvolvimento de São Paulo está esgotado, por isso é importante repensar a cidade. A subjetividade do Plano de 2002 gerou muitos problemas, por isso desta vez, esperamos que as regras sejam claras. Por exemplo, a questão de modificação de projetos. Foi determinado no Plano que os projetos protocolados antes da promulgação da lei poderiam sofrer modificações, só que não foi estabelecido o que se entende por modificação de projeto e isto criou transtornos a vários empreendedores. A revisão deve ser pautada para fortalecer a mobilidade na cidade. É importante que se criem mecanismos que identifiquem os ajustes necessários ao longo da vigência do Plano, afinal dez anos é muito tempo para uma cidade tão dinâmica como São Paulo. A questão mais urgente é a mobilidade urbana, pois a partir dela, se molda todo o modelo de ocupação de uma cidade. O ideal é seria ter uma rede de transporte público eficiente com mais 400 km de linhas de metrô em curto prazo. Como isso não é possível, é preciso estudar novos modelos de ocupação urbana, constituídos de polos de adensamento autossustentáveis, em que atividades do dia a dia possam ser desempenhadas sem grandes deslocamentos pela cidade.
Nós participamos das discussões como qualquer outro membro da sociedade e apesar das críticas, o mercado imobiliário só coloca em prática aquilo que é decidido pelo Plano Diretor.
O que pensa Osmar Silva Borges, coordenador da Frente de Luta por Moradia defende a destinação de moradia às famílias com renda de até 3 salários mínimos
A FLM está aguardando a reabertura da discussão para ver as propostas e agir em defesa dos interesses das classes mais baixas. O maior entrave para a implantação do plano é o choque entre interesses social e comercial. O governo deve agir para que a especulação imobiliária não faça com que moradores de antigas regiões fabris sejam enxotados para áreas periféricas, atendendo a intenção do mercado imobiliário em promover a vinda da classe média alta para locais como estes. O mecanismo para realizar isso é o Plano Diretor.
A reivindicação do grupo é que os prédios vazios do Centro expandido sejam desapropriados e destinados às famílias com renda de até 3 salários mínimos. A ocupação mista do Grande Centro por esta classe sai mais barato, pois toda a infraestrutura de transporte público, escolas, comércio e oferta de empregos já está montada. E o pensamento em políticas que sejam boas para o social e para o meio ambiente.
O que pensa Ermínia Maricato, professora da FAU-USP
O plano antigo era tão bom que as forças econômicas fizeram com que ele fosse ignorado. No Brasil, nenhuma cidade segue o planejamento previsto nos seus Planos Diretores. O papel aceita tudo, mas na realidade, surgem conflitos de interesses e o poder econômico fala mais alto. As grandes empresas incorporadoras, já tem articulado entre eles, um plano para São Paulo. Nós, da sociedade civil, temos que nos unir para lutar contra as forças que dominam a cidade, pois ainda falta gente informada lutando pelo benefício público e coletivo. Por exemplo: o transporte coletivo é fundamental, mas esbarra nos interesses da indústria automobilística, assim como o controle do uso do solo também é essencial e emperra com a especulação imobiliária.
A cidade está rumo ao abismo e a situação só tende a piorar. A sociedade deve dizer que o transporte privado não é uma prioridade. Prioridade deve ser dada ao transporte público e a melhoria das condições de vida das pessoas que moram na periferia. Ainda assim, torço pela Frente do Plano Diretor, mas sem o engajamento popular, não há dúvida de que seremos derrotados novamente.
O que pensam os membros do BijaRi, Coletivo artístico
A arte deve estar presente no cotidiano das pessoas, é preciso torná-la indispensável e aproveitar seu poder transversal para chamar a atenção da sociedade para questões importantes. O novo Plano deve garantir o acesso à cultura e fomentar atividades culturais em todas regiões da cidade. A descentralização da cultura é fundamental para que se possa contemplar mais artistas e levar a arte para áreas fora do eixo cultural atual. De maneira geral, estamos otimistas com a revisão do Plano, pois a sociedade está mais participativa e inteirada do assunto do que na criação do texto de 2002.