Design dos uniformes olímpicos: uma questão de gênero

Em meio à debates sobre as restrições, desconforto e machismo dos uniformes das atletas mulheres, marcas lançam modelos unissex

Por Yara Guerra
2 ago 2021, 13h00
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Os atletas olímpicos do skate poderão escolher o look entre 20 peças desenhadas pela Nike (Nike/Divulgação)

Vamos combinar uma coisa? Assistir às Olimpíadas é demais. Descobrir esportes inusitados, torcer pelo seu país, vibrar por atletas carismáticos de outros (salve, Margielyn Didal), acompanhar decisões em um fuso horário louco que bagunça a nossa rotina. Tudo isso é incrível, a gente sabe.

Mas uma dos pontos mais legais de um evento gigante como os Jogos Olímpicos talvez seja o poder que eles têm de incorporar o debate público e contribuir com ele. Nesta edição, um exemplo claro e prático foram os uniformes. Muitas vezes sexistas, os designs são pensados de forma a valorizar não a habilidade e o conforto das atletas, mas a sua aparência.

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Em entrevista à revista Trip, em 2020, a jogadora de vôlei de praia Carol Solberg contou que, apesar de gostar de jogar de biquíni, a situação pode vir a ser desagradável e que ela mesma já foi vítima de fotógrafos cujo objetivo eram fotos de conotação sexual. Além disso, há a questão do clima: em outros países, jogar de biquíni durante uma frente fria é desconfortável (@carol_solberg / Instagram/Reprodução)

Infelizmente, ainda hoje o respeito no esporte está muito mais restrito aos homens, enquanto as mulheres são vistas como meros adornos. Como são poucas as lideranças femininas dentro das organizações esportivas, a maior parte das decisões importantes ficam a cargo de homens – geralmente brancos –, o que contribui para esse ciclo machista vicioso.

No entanto, a iniciativa de algumas marcas e esportistas têm feito a diferença e ido na contramão desta problemática de gênero. É o caso da Nike e da Telfar, responsáveis pelos designs de algumas seleções nas Olimpíadas de Tóquio:

Nike just did it

 

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A Nike desenhou várias opções de uniforme para os atletas de skate escolherem (Vestindo Autoestima/Reprodução)
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Algumas modalidades e confederações seguiram uma linha respeitosa e diversa na hora de pensar o uniforme de seus atletas. A Nike, por exemplo, fez uma coleção com mais de 20 peças para os integrantes do skate da França, Brasil e EUA, que poderiam escolher que roupa usar.

A partir da não imposição de um modelo específico aos atletas, a marca fez um aceno de respeito às skatistas e ainda valorizou o estilo de cada um. E pontuou mais uma vez ao produzir peças sustentáveis com poliéster reciclado.

Libéria e os trajes unissex

 

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(Jason Nocito/)

A marca de moda Telfar, por sua vez, projetou uma coleção de uniformes unissex para a equipe liberiana nos jogos olímpicos.

Macacões, batas, tops e outros itens de vestuário foram desenhados pelo estilista liberiano-americano Telfar Clemens e seu parceiro de negócios, Babak Radboy, especialmente para a equipe olímpica da Libéria.

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(Jason Nocito/)

Algumas das peças estrearam já na cerimônia de abertura olímpica no Estádio Nacional de Tóquio e contam uma narrativa de reconhecimento e repatriamento, segundo os designers.

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Elas incorporam tons das cores da bandeira liberiana – azul, vermelho e branco –, além do dourado. Grandes estrelas foram impressas em um aceno à única estrela da bandeira.

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(Jason Nocito/)
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Os estilos de roupas africanas também aparecem na coleção sem gênero. O lappa africano – uma saia ou vestido colorido tradicional que envolve o usuário – se manifesta como uma peça de roupa amarrada que pode ser usada por atletas homens e mulheres.

Seleção norueguesa de handebol e a polêmica do biquíni

 

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A seleção norueguesa de handebol de praia foi multada por substituir o tradicional biquíni por shorts mais confortáveis (Vestindo Autoestima/Reprodução)

Os lançamentos da Nike e da Telfar vieram em um momento oportuno de debate. Neste mês de julho, a seleção norueguesa de handebol de praia foi multada em 1.500 euros (cerca de R$ 9.200) após a decisão de substituir o traje convencional por um mais confortável, alegando que o uniforme convencional restringia os movimentos, era desconfortável e as hiperssexualizava.

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(Vestindo Autoestima/Reprodução)

Segundo a federação, o uso de shorts vai contra o regulamento por serem “trajes impróprios“. No mais, a peça escolhida por elas é muito semelhante ao uniforme do time masculino, que pode jogar de regata e bermuda sem problema algum.

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Serena Williams, a rainha de Wakanda

 

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Depois da proibição do macacão, Serena Williams voltou às quadras usando um tutu de bailarina. E a Nike respondeu à Federeção: “Você pode tirar o uniforme da super-heroína, mas nunca seus superpoderes” (Vivendo Autoestima/Reprodução)

Mas as meninas do hand não foram as únicas a trocar o traje e se posicionar. Em 2018, a supercampeã do tênis Serena Williams optou por usar um macacão como uniforme durante uma disputa no Roland Garros. A peça desenvolvida pela Nike era justa e estimulava a circulação sanguínea, já que este foi um dos problemas enfrentados por ela na então recente gestação.

Na ocasião, Serena disse: “Este traje representa todas as mulheres que passaram por muitas dificuldades, mental e fisicamente, para voltar a ter confiança e acreditar em si mesmas. Essa roupa fez com que me sentisse como uma princesa guerreira, tipo a rainha de Wakanda”.

Apesar do empoderamento emocionante, porém, a atleta norte-americana foi proibida pelo presidente da Federação Francesa de Tênis, Bernard Giudicelli, de voltar a vestir o macacão nas quadras.

Nas Olimpíadas

 

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(Mike Blake / Reuters/Reprodução)
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A problemática dos uniformes sexistas voltou a ganhar força durante as Olimpíadas de Tóquio, quando as ginastas alemãs optaram por abandonar os collants e usar legging nas apresentações para evitar a sexualização do corpo feminino.

Nesse caso, elas não quebraram nenhuma regra anterior. O uso do chamado “full-body suit” é previsto no regulamento da Federação Internacional de Ginástica (FIG), visando incluir atletas que não podem usar os collants cavados na virilha, normalmente por motivos religiosos.

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(@__kim.bui_ / Instagram/Reprodução)

O posicionamento das atletas, no entanto, teve um viés político e foi além, chamando atenção para as denúncias de assédio sexual na ginástica olímpica.

Por aqui, a nossa redação torce para que a coragem das atletas e iniciativa e pioneirismo das marcas citadas inspirem cada vez mais outros esportistas e federações para que o mundo do esporte seja cada vez mais consciente, respeitoso e inclusivo.

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